Capital de giro: um desafio permanente
Capital de giro: um desafio permanente
O capital de giro representa em média 30 a 40% do total dos ativos de uma empresa. O capital permanente tem um peso maior sobre o total dos ativos, atingindo entre 60 e 70%.
Apesar de sua menor participação sobre o total dos ativos da empresa, o capital de giro exige um esforço do administrador financeiro maior do que aquele requerido pelo capital fixo.
O capital de giro precisa de acompanhamento permanente, pois está continuamente sofrendo o impacto das diversas mudanças enfrentadas pela empresa. Já o capital fixo não exige atenção constante, uma vez que os fatos capazes de afetá-lo acontecem com uma frequência bem menor.
Boa parte dos esforços do administrador financeiro típico é canalizada para resolução de problemas de capital de giro - formação e financiamento de estoques, gerenciamento do contas a receber e administração de déficits de caixa.
Nesta luta para sobreviver, a empresa acaba sendo arrastada pelos problemas de gestão do capital de giro e tende a sacrificar seus objetivos de longo prazo. Os empresários conhecem bem este fenômeno. Boa parte de seu tempo é consumido "apagando incêndios", onde o foco mais perigoso reside no capital de giro.
Medidas para solucionar a falta de capital de giro
As dificuldades de capital de giro numa empresa são devidas, principalmente, à ocorrência dos seguintes fatores:
- Redução de vendas
- Crescimento da inadimplência
- Aumento das despesas financeiras
- Aumento de custos
- Alguma combinação dos quatro fatores anteriores
Na situação mais frequente, os problemas de capital de giro surgem como consequência de uma redução de vendas. Neste caso, o administrador financeiro se defronta com as seguintes questões: como manter o capital de giro sob controle diante de um quadro de redução das vendas ? o que pode ser feito para evitar uma crise maior de capital de giro ?
Os tópicos seguintes apresentam algumas alternativas de solução para essas questões.
1. Formação de reserva financeira
Como acontece no trato de muitos outros problemas, a ação preventiva tem um papel importante para a solução dos problemas de capital de giro.
A principal ação consiste na formação de reserva financeira para enfrentar as mudanças inesperadas no quadro financeiro da empresa.
A determinação do volume dessa reserva financeira levará em conta o grau de proteção que se deseja para o capital de giro. Também uma análise do tipo "o que aconteceria ao capital de giro se...." poderia ser bastante útil para se formular a estimativa do volume da reserva financeira.
À primeira vista, poderia soar antieconômico a formação de uma reserva financeira, já que esta decisão tiraria recursos financeiros que de outra forma deveriam ser aplicados no investimento em ativos fixos de modo a permitir a expansão da empresa.
Dada a alta volatilidade da economia brasileira, a formação de reserva financeira para o capital de giro deveria ser a prioridade econômica fundamental da empresa. Além disso, os recursos destinados e essa reserva seriam aplicados no mercado financeiro, onde as taxas de juros têm sido maiores do que a taxa de rentabilidade do capital fixo.
2. Encurtamento do ciclo econômico
Quando a empresa encurta seu ciclo econômico - este pode ser definido como o tempo necessário à transformação dos insumos adquiridos em produtos ou serviços - suas necessidades de capital de giro se reduzem drasticamente.
Numa indústria, a redução do ciclo econômico significa um menor tempo para produzir e vender. No comércio, esta redução significa um giro mais rápido dos estoques. Na atividade de serviços, a redução do ciclo econômico significa basicamente trabalhar com um cronograma mais curto para a execução dos serviços,
A redução do ciclo econômico não é uma função tipicamente financeira. Ela requer o apoio de funções como produção, operação e logística.
3. Controle da inadimplência
A inadimplência dos clientes de uma empresa pode decorrer do quadro econômico geral do país ou de fatores no âmbito da própria empresa.
No primeiro caso, a contração geral da atividade econômica e a consequente diminuição da renda das pessoas, tende a aumentar a inadimplência. Nesta situação, a empresa tem pouco controle sobre o problema.
Quando a inadimplência é decorrente de práticas de crédito inadequadas, estabelecidas pela própria empresa, existe uma solução viável para o problema. Neste caso, é preciso dar mais atenção à qualidade das vendas (tanto as vendas a crédito como as vendas faturadas) do que ao volume dessas vendas. No caso das vendas a crédito, também será recomendável uma redução do prazo de pagamento concedido aos clientes.
4. Não se endividar a qualquer custo
Na tentativa de suprir a insuficiência de capital de giro, muitas empresa utilizam empréstimos de custo elevado. Como regra, qualquer dinheiro captado a um custo maior do que 1,17% ao mês (ou 15% ao ano) em termos reais, é incompatível com a rentabilidade normal da empresa que é de 15 % ao ano, também em termos reais. Assim, uma linha de crédito de curto prazo que hoje não custa menos do 2% ao mês em termos reais, é claramente antieconômica.
O financiamento de capital de giro a uma taxa real maior do que 1,17% ao mês, pode resolver o problema imediato de caixa da empresa, mas cria um novo problema - seu pagamento.
O administrador tem consciência da inviabilidade do custo financeiro dos financiamentos de capital de giro. Ele tenta ganhar tempo, esperando que uma melhora posterior nas condições de mercado da empresa permitam pagar o capital de terceiros. Todavia, quando a recuperação das vendas acontece, a empresa já acumulou um estoque de dívidas cujo pagamento será impraticável.
5. Alongar o perfil do endividamento
Quando a empresa consegue negociar um prazo maior para o pagamento de suas dívidas, ela adia as saídas de caixa correspondentes e, portanto, melhora seu capital de giro. Embora essa melhora seja provisória, ajudará bastante até que a empresa se ajuste financeiramente.
Também neste caso, é importante uma atenção especial para o custo do alongamento de prazo. Ele precisa ser suportado pela rentabilidade da empresa.
6. Reduzir custos
A implantação de um programa de redução de custos tem um efeito positivo sobre o capital de giro da empresa desde que não traga restrições às suas vendas ou à execução de suas operações.
Uma vez que a empresa com problema de capital de giro também estará com sua capacidade de investimento comprometida, a redução de custos em atividades como modernização, automação ou informatização não será possível.
Diante de uma crise de capital de giro, o programa de redução de custos tem natureza compulsória e seu grande desafio é identificar aqueles itens de gastos que possam ser cortados sem grandes prejuízos para as atividades da empresa. Dificilmente serão encontrados gastos supérfluos ou desperdícios, pois a crise de capital de giro naturalmente já os deve ter eliminados.
7. Substituir passivos
A política de substituição de passivos consiste em trocar uma dívida por outra de menor custo financeiro. Por exemplo, uma empresa de grande porte poderia adotar esta solução, através do lançamento de títulos no exterior ou mesmo fazendo um lançamento de ações. Entretanto, as empresas de pequeno e médio porte não têm essa opção. Um programa tradicional de substituição de passivos para essas empresas quase sempre significaria trocar seis por meia dúzia.
Numa situação extrema, as pequenas e médias empresas poderiam trocar passivo exigível por passivo não exigível (capital), através da admissão de novos sócios. Sem dúvida, esta seria uma solução a ser adotada em último caso.
Solução definitiva
É evidente que existe um forte entrelaçamento entre a administração do capital de giro da empresa e sua administração estratégica.
Por isso, a solução definitiva para o problema do capital de giro consiste na recuperação da lucratividade da empresa e a consequente recomposição de seu fluxo de caixa.
Esta solução exige a adoção de medidas estratégicas de grande alcance que vão desde o lançamento de novos produtos ou serviços e a eliminação de outros, adoção de novos canais de venda ou até mesmo a reconfiguração do negócio como um todo.
Desse modo, a solução dos problemas de capital de giro de uma empresa requer muito mais do que medidas financeiras. Estratégias, operações e práticas gerenciais, entre outras, precisarão ser repensadas para que o capital de giro volte ao estado de normalidade.
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O saneamento financeiro de uma empresa tem como objetivo básico ajustar suas finanças para salvá-la do colapso e permitir um funcionamento normal.
A implantação de um programa de saneamento financeiro começa com a identificação das causas do desequilíbrio financeiro. Nesse sentido, a primeira questão a ser respondida é se a empresa é realmente viável. Considerando metas factíveis de vendas e custos, a empresa poderia aspirar a um patamar razoável de rentabilidade?
Uma vez que muitas empresas são abertas sem uma análise econômica prévia, diante de uma crise financeira é importante verificar se a viabilidade econômica não dependeria de metas de vendas ou custos inatingíveis.
Então, diante de quadro financeiro adverso, a empresa precisa fazer uma análise inversa que informa qual o volume de vendas e o nível de custos necessários para gerar uma taxa de rentabilidade razoável para o capital próprio.
Para a maioria dos agentes econômicos, a taxa razoável de rentabilidade sobre o capital próprio é 15% ao ano. Este percentual também representa a rentabilidade real média de longo prazo do capital próprio das empresas.
Caso a empresa tenha algum endividamento, será necessário também analisar a rentabilidade do capital após os impostos e antes do pagamento dos juros. A existência de resultado positivo após os impostos e antes dos juros, mas que se transforma em prejuízo após a inclusão desses últimos, indica que o problema da empresa é de origem financeira, por exemplo, um alto grau de endividamento ou a existência de linhas de crédito com taxas de juros elevadas. Em alguns casos, esta situação foi causada por um problema de sazonalidade de vendas ou mesmo de custos. Como a empresa não tinha instrumentos de controle financeiro, não fez um planejamento financeiro adequado e, por isso, mergulhou num quadro de crise financeira.
O fato é que, somente se for confirmada a viabilidade econômica da empresa, fará sentido a adoção de um processo de saneamento financeiro. Desse modo, o saneamento financeiro consiste na implementação de um conjunto de medidas com o objetivo de melhorar as principais variáveis financeiras da empresa.
No momento zero do plano de saneamento financeiro, deverá ser buscado um alongamento não oneroso dos passivos financeiros da empresa. O objetivo dessa medida é diminuir a pressão sobre o caixa, mas sem que isso traga restrições ao normal funcionamento da empresa.
Negociação com fornecedores visando obter melhores condições de prazo e substituição de linhas de crédito por outras de prazo mais longo são as medidas mais eficazes.
Qualquer redução do ciclo de caixa (visando retardar as saídas de caixa e antecipar as entradas) com medidas operacionais também são muito eficazes para o saneamento financeiro, já que a necessidade de capital de giro será encolhida.
Uma medida também muito eficaz é a venda de imóveis e seu aluguel subseqüente (sale lease-back). Quando esta decisão não trouxer restrição operacioanal, permitirá que o produto da venda seja usado na liquidação de empréstimos. Com isso, o custo financeiro terá uma forte redução, já que o aluguel representa no máximo 12% ao ano do valor do imóvel. Para a maioria das empresas, o custo dos empréstimos bancários é bem maior do que esse percentual.
Depois de reduzir as saídas de caixa e alongar o prazo de vencimento da dívida, a empresa deverá buscar reduzir o estoque de sua dívida. Quando uma crise financeira se instala numa empresa, seu grau de endividamento normalmente está bem acima do recomendável.
Decisões que possam acarretar elevação do risco financeiro da empresa deverão ser descartadas. Assim, projetos de expansão, por exemplo, deveriam ser provisoriamente postergados.
Uma vez saneadas as finanças da empresa, ela poderá começar a fazer pequenos investimentos produtivos e programas de redução de custos.
A visão de saneamento financeiro aqui apresentada indica que ele dá melhores resultados quando é implementado isoladamente. Programas mais ambiciosos como, por exemplo, "turn around", dependerão de um prévio saneamento das finanças da empresa.
É possível implementar um plano de saneamento financeiro juntamente com um programa de recuperação de vendas e lucratividade. Entretanto, a jornada dupla terá um um grau de risco bem mais elevado e exigirá um esforço de análise bem maior por parte da administração.